Quem são os malucos?
Hoje apetece-me falar a sério - dentro das minhas limitações - sobre um assunto que é um não-assunto para a maioria dos terrestres.
Cada dia que passa por mim a correr, mais reforça a ideia de que os terrestres estão cada vez mais antipáticos, mais egoístas, mais insensíveis, sofrendo de graves lacunas no departamento da empatia, poderia continuar, mas ficamos por aqui.
No passado fim-de-semana, encontrava-me a comer uma tosta mista com o Alien macho, quando um terrestre com uma idade que devia de rondar os trinta anos, me pediu um cigarro. Sorri. Ofereci-lhe o cigarro.
A empregada - nossa conhecida - de imediato nos deu a dica: " Ele fala com toda a gente".
E não é que falava mesmo. Perguntou-me se tinha vindo de Lisboa ao que respondi afirmativamente. É óbvio que era perceptível que este humano não era "igual " aos outros. Tem um problema, é considerado por todos como um maluquinho, um ser que geralmente é tratado de uma forma condescendente, ou ignorado por completo.
O facto é que fomos conversando enquanto ele desfrutava do cigarro que lhe tinha oferecido. Perguntou-nos se tínhamos apanhado muito trânsito, ao que respondemos que não. Enquanto eu e o Alien macho trocávamos umas palavras ele ia falando com outros terrestres, sentados na mesa ao lado. A empregada brincava com ele. Seu nome: João.
Virou novamente a atenção para nós e continuou a satisfazer a sua curiosidade. Como se de uma criança se tratasse. Que gosta de saber os porquês de tudo o que o rodeia. Não o tratámos como um ser diferente. Falei com ele como se falasse com um terrestre "normal".
Agora, é aqui que tenho de parar. Normal? Quem define o que é normal? Quem decide o que são comportamentos normais? A sociedade, os médicos? Se é a sociedade, então nós é que somos os malucos, porque aquele ser humano, era uma simpatia, era genuíno, não tinha qualquer tipo de filtro.
Se todos os humanos tivessem um comportamento similar ao do João, a nossa sociedade seria um cenário bem mais agradável para se viver. A maioria dos terrestres acha que andar carrancudo, ser anti-social, é o comportamento a ter, para fazer parte de um grupo de humanos que acreditam que um sorriso vale milhões.
Hoje em dia, é complicado encontrar pessoas simpáticas. E o mais estúpido é quando um ser é simpático por natureza e esbarra sempre contra este dilema: É simpático e os outros humanos reagem de forma positiva à sua postura, retribuindo da mesma forma; ou então a sua simpatia é encarada como falta de personalidade e são tratados com um certo desprezo.
É só fazer o teste. Entrar numa loja, onde a senhora está com cara de quem comeu e não gostou. Se somos simpáticos, recebemos em troca antipatia. Se colocamos uma cara arrogante, somos bem tratados. Experimentem. Mas, este foi um exemplo aplicável a muitas outras situações.
Voltando ao João. Naquela esplanada, quem era o maluco? Nós, ele? Neste caso nenhum de nós porque conversámos sem tabus, sem julgamentos pré-definidos.
Para finalizar, quero deixar aqui a minha desaprovação por aquilo que fizeram a seres humanos como o João, que costumavam passear de um lado para o outro na Av. do Brasil. Não me perguntem quem levou a cabo esta medida, apenas sei que os seres inofensivos que se encontravam à porta do Hospital Júlio de Matos, foram todos escondidos, provavelmente em algum buraco bem fundo.
Se repararem, já não encontram nenhum desses seres a pedir uma moedinha. É triste, quando uma sociedade despreza humanos que não têm culpa de serem, apenas, diferentes.
Voltando ao início deste texto.
O problema reside nesta sociedade em que vivemos, onde o ser diferente é merecedor de desprezo, merecedor de ser ignorado, merecedor de ser invisível.
Eu ainda consigo ver. E vocês?
Mas isto sou só eu